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19 fevereiro 2014

Sócrates: “Não vou salvar a pátria. Sou apenas corintiano”

Sócrates vestido de Dom Pedro I - Foto: Luis Crispino

PLACAR

O ex-craque do Corinthians e da seleção brasileira, Sócrates, completaria 60 anos, nesta quarta-feira (19/02). Relembre depoimento dele à Carlos Maranhão, da PLACAR, em fevereiro de 1981 sobre a situação do time paulista.

Não vou salvar a pátria. Sou apenas corintiano

Ao deixar o país para jogar as Eliminatórias da Copa de 1982, o doutor era bombardeado com notícias ruins do Timão. O remédio: sua volta

Longe de casa, torna-se mais difícil analisar os problemas dos companheiros que ficaram. Não se sente a barra, só se sabe do que anda acontecendo, assim meio por cima. E a gente acaba correndo o risco de cometer erros de avaliação. Mesmo daqui, porém, um ponto parece de extrema clareza: o Corinthians precisa de mais diálogo. Quando renovei meu atual contrato, em setembro do ano passado, insisti com o presidente Vicente Matheus para que esse diálogo fosse posto em prática.

O Matheus aceitou minha proposta e a situação começou a evoluir gradualmente nos últimos meses de 1980. Mas parece que as coisas ainda estão longe do ideal, até porque não se muda um conceito de vida em tão pouco tempo. Em outras palavras, o que se necessita no futebol do Corinthians – e não só no Corinthians, nem unicamente no futebol – é estreitar a distância que separa o patrão do empregado. No nosso caso específico, o empregado, que é o jogador, tem seus deveres muito bem colocados. Tudo perfeito. Só que o relacionamento acaba exatamente aí. Você nunca deixa de ser exclusivamente um empregado. O ser humano não existe. As questões pessoais não são levadas em conta. Ora, diante de uma mentalidade dessas, o profissional vai fazer o quê? Vai fazer o essencial, vai bater o seu ponto e vai embora na hora marcada. Ele não tem estímulo para agir além do dever, para criar, para amar seu ambiente de trabalho.

Sinceramente, eu respeito e admiro as empresas com capacidade para levar seus funcionários a dizer em público: “Nós, da empresa tal…” Como eu gostaria que o time todo falasse “Nós, do Corinthians” ou “Nós, corintianos”. E não “Eu, fulano” ou “Eu, beltrano”.

O que eu queria – e sei que outros companheiros também querem – é que o Corinthians fosse a extensão da família de cada um de nós. E no entanto não é. Por isso, prometo aos corintianos que, ao voltar a São Paulo, continuarei lutando, com a força do prestígio que adquiri nesses anos de futebol, para mudar tal quadro. Penso que será minha contribuição essencial para enfrentar nossa crise passageira – depois, é lógico, de minhas atuações dentro de campo.

Capa da edição 561 da PLACAR, de 13/2/1981


E o time? Não precisa de reforços? Responderei com minha franqueza habitual: sim, precisa. Mas qual é a equipe que não precisa? Se formos analisar a fundo, nem a seleção brasileira pode dispensá-los. Agora mesmo, por exemplo, em relação ao grupo que disputou o Mundialito, ela foi reforçada com os retornos de Zico e Reinaldo. Prefiro não me aprofundar na parte técnica do time, embora faça questão de afirmar: nosso time é bom. E tanto é bom que fomos campeões paulistas. Ou já se esqueceram que a equipe era praticamente a mesma, descontando-se a saída do meu querido amigo Palhinha?

O Solitinho é um ótimo goleiro, sim. Ele precisa ser mantido e mostrar personalidade forte para superar um problema momentâneo. O SuperZé está velho? Então não entendo como ele consegue correr mais do que eu. O resto da equipe vai nesse nível: Amaral, Djalma, Vlado, Caçapa, Basílio, Biro, Vaguinho, Geraldão… Pô, é um bom time! O seu Brandão? Olha, o velho Caçamba é um sujeito maravilhoso. Ele é uma das figuras humanas que mais me sensibilizaram na vida. Se ele já foi duas vezes campeão pelo Corinthians, por que não o será uma terceira?

Para concluir, gostaria de pedir um favor aos meus caros amigos corintianos: quando eu regressar, não me vejam como o salvador da pátria. Sou apenas um cara que tem consciência de que não é nem perna-de-pau nem um gênio capaz de agir sozinho. Não sou o Sócrates F.C. Quem irá recuperar o Corinthians será o Corinthians todo, o Corinthians unido, corrente pra frente, time-torcida, diretoria-jogadores, patrões-empregados, no clima de diálogo e entendimento com que todos sonhamos. Enfim, acho que má fase, ainda mais num campeonato em que o título não está sendo decidido agora, é um fenômeno passageiro, como as folhas secas do outono.

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